"Que vá morrer longe!", ouvi eu da boca de uma senhora, numa viagem de trem há uns dias atrás. No decorrer da escuta à conversa atenta, compreendi que a senhora referia-se daquela forma raivosa ao companheiro de nove anos, agora apelidado de «defunto». E fiquei com esta expressão «que vá morrer longe» colada ao ouvido, tal como o cerúmen fica ao acordar. Após reflexão demorada do Pragal até Roma-Areeiro, concluí que nunca irei compreender francamente este clima de hostilidade e de ódio criados pela maioria das pessoas após terminarem relacionamentos amorosos. Será um mecanismo de defesa criado para esquecer momentos de vulnerabilidade, de entrega, de companheirismo, de paixão, de sexo e de juras de eterno amor? Penso que não. É uma vingança, sobretudo, realizada em nós, por nós e em nosso nome. É uma espécie de catarse vivida com ódio e na rua da hostilidade, exponenciadas por uma pitada de raiva. No fundo, o escárnio, o mal-dizer, o ódio, a hostilidade, o desprezo e a raiva são manifestações externas de uma tentativa interna profunda de castigar o outro pelo fim da relação. É a expiação da dor, pura e dura. Em suma, não se comprazerão com a mera possibilidade de uma futura amizade. Não estão lá mais, para aquele tipo ou tipa.
A transição gramatical que ocorre é uma prova disso mesmo. Passa-se facilmente de uma terminologia de índole carinhosa (exemplo: «amor», «paixão», «ursinho», «princesa», «pequenina», «lindinho») para outra que é a sua antítese (exemplo: «ex», «defunto», «puta», «cabra», and so on...). No entanto, este tipo de comportamento organizado contra essa cambada dos ex é suportada voluntariamente, numa tentativa vil e artificial de esquecer tudo aquilo que foi importante para si em tempos. A vida é muito engraçada... Não concordo, não professo, não gosto. Mas também me fazem disto. E se fazem...
Boa? Boa.
2 comentários:
Grande, grande post.E não é pelo numero de linhas.
Subscrevo na integra.
Um abraço
bem... não sendo eu a visada, talvez falando um pouco de mim tu me possas ajudar. como eu não consigo encaixar uma reconciliação num quadro como o meu, talvez tu vendo de fora me mostres que as coisas são mais fáceis do que eu as tenho vivido e uma opinião isenta é sempre bem vinda.
então explica-me como posso eu "livrar-me" de uma perseguição quase doentia de alguém que agiu muito mal para comigo e que de repente acordou para a vida e decidiu que quer ficar comigo, nem que seja à força?
acredita que em alturas de desespero passa-te muita coisa pela cabeça e a primeira é fugir. mas eu cheguei à conclusão que não era a fugir que ultrapassava a situação e por isso tentei despojar-me de toda a raiva e mágoa que sentia contra ele e substituir por indiferença. bloquear com todas as minhas forças o pavor que ele despertava em mim.
e por mais que eu lhe disser que acabou de vez e que nunca conseguirei confiar novamente nele, ele não aceita e limita-se a responder que se suicida se eu não ficar com ele?
por causa disso e não só já tive de mudar muita coisa na minha vida e durante muito tempo tive receio de ele me aparecer novamente à frente completamente louco e de me fazer mal.
se tu soubesses... aliás, se eu soubesse há 4 anos o que sei hoje, a minha vida teria sido muito diferente... porque nunca eu me teria envolvido com alguém que tanto mal me tem feito. talvez por isso é que nos piores momentos, não tanto como desejo (porque eu não lhe desejo mal nenhum, só desejo paz!), mas mais como desabafo, eu acabei por dizer "que vá morrer longe!"...
hoje já posso dizer que já não me atinge. que nada do que ele me fez desde que a relação acabou ou do que motivou o final me afecta. já não interessa. "o que não nos mata torna-nos mais fortes" e eu cresci, aprendi e avancei.
se calhar o meu caso até dava um bom case-study...
e já agora, só para terminar, eu respondi a um post do João... e não ao teu post. não te censurei a ti nem a ele, limitei-me a mostrar o outro lado.
mas já que te interessaste no meu caso, quem sabe não sejas tu a ter a ideia brilhante que ainda ninguém teve e consigas, de vez, reponder-me a uma pergunta que gira à minha volta nestes últimos meses: como é que eu bloqueio o acesso de certa pessoa à minha vida e consigo ficar, novamente, em paz?
boa? boa!
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